"Só se pode viver perto de outro, e conhecer outra pessoa, sem perigo de ódio, se a gente tem amor". João Guimarães Rosa

31 agosto 2007

A DITADURA DO MÉTODO

No Brasil, um dos principais conflitos, não explicitados, que se manifestam na educação é entre professores e os ditos especialistas que atuam na educação (pedagogos, psicólogos, supervisores, inspetores, etc). A causa principal dessa desavença é quanto ao método, que em vez de ser utilizado pelo professor de acordo com seus interesses pedagógicos ou mesmo pela afinidade que tem com um ou outro método, é imposto a ele pelas instituições de ensino, visando homogeneizar o “processo de aprendizagem” dos seus alunos.

É intensamente divulgado aos profissionais de educação, ficando até saturado a expressão, que a “missão fundamental de quem ensina é ajudar os alunos a pensarem por si próprios”. Fico pensando como! Pois se não é permitido a liberdade ao professor de escolher quais as estratégias, métodos, a didática mais adequada para ensinar determinado conteúdo, como ele poderá ensinar algo que ele não tem? A liberdade da escolha desses processos que envolvem a mediação do conhecimento do professor para o aluno é tão importante quanto a liberdade teórica da discussão entre docente e o discente dos conteúdos em que o professor é especializado. Uma expressão colhida num dos livros estruturadores do pensamento ocidental, pode representar bem esse imbróglio educacional, implantado com a supremacia dos especialistas sobre o ato de ensinar: “por ventura pode um cego guiar outro cego? Não cairão ambos no barranco?”[1] que é a meu ver essa expressão muito bem representada pelo quadro de Pieter Brueghel (ao lado).

Os professores reclamam e com razão que especialistas que nunca pisaram numa sala de aula, porém dominam um certo número de teorias que norteiam os rumos da educação, tiraram-lhes a liberdade. Liberdade que é a essência da profissão do professor, se ele não se sentir livre para ensinar, dificilmente os objetivos serão atingidos.

O que é mais grave, é que normalmente esses especialistas, com respaldo institucional, impõem ao professor o método da moda, ou aquele com a qual a instituição sente certa afinidade. Em contrapartida os especialistas, juntamente com as faculdades de educação, fincam pé nas suas “verdades absolutas”, partem para desqualificação dos professores que reagem a ditadura do método de ensino, ou são indiferentes a eles. Aí o resultado é esse que nós estamos acompanhando de camarote, dentro e fora das escolas.

Logo, percebe-se que esses profissionais não se entendem, um acha que manda e os outros fingem que obedecem e os alunos no meio disso, principalmente aqueles que não querem saber de nada, infelizmente a grande maioria, saem ano após ano tão ignorante quanto quando entraram na escola.

Professor que é professor não precisa de nenhuma babá pseudo-intelectual direcionando o seu trabalho. Ele é capaz de discernir qual o método é mais adequado para utilizar em sala de aula. Os profissionais da educação, devem ser suporte para esse professor e para os alunos. Os atores principais são professor e alunos o resto são apenas coadjuvantes do processo educacional. Porém quando tentam assumir um papel que não lhes são oportunos a educação sai perdendo em muito. E com isso toda a sociedade.

Vamos fazer uma analogia: um hospital, um médico, um paciente. De repente, José (paciente) não se sentindo bem, resolve procurar um hospital e marca uma consulta com um especialista. É atendido e o médico utiliza todos os procedimentos que ele julga necessários para curar o José. Até aqui tudo bem, não é! Pois vejamos o que poderia acontecer com José se neste tripé fosse aplicado o princípio gerencial atual que é aplicado nas escolas, com alunos e professores. José procura o hospital, marca a consulta com determinado especialista, este lhe atende, faz o diagnóstico, vêm um monte de especialistas, que não são médicos, e obrigam o médico que atendeu José a adotar determinados procedimentos. Esses procedimentos foram homogeneizados para todos os pacientes que qualquer médico venha atender, ou seja, é como indicar uma única medicação independente da moléstia que o paciente apresente. Se um paciente encontra-se num quadro de hipertensão e um outro tem câncer, os médicos, mesmo tendo especialidade distinta são obrigados a utilizar os mesmos medicamentos, os mesmos exames, o mesmo tratamento. Entendeu o que vem ocorrendo nas escolas brasileiras já há muito tempo?

Uma solução simples para isso é proporcionar a liberdade essencial para o professor de utilizar o método que lhe for mais conveniente. Quanto aos especialistas que vão para a sala de aula dos cursos de formação de professores e aplicam lá o método que desejarem. Isso é a chamada práxis.

[1] Novo Testamento, Lucas, 6:39.