"Só se pode viver perto de outro, e conhecer outra pessoa, sem perigo de ódio, se a gente tem amor". João Guimarães Rosa

09 agosto 2004

O ÚLTIMO TANGO EM PARIS

Caminhando pelas ruas movimentadas da jaula urbana parisiense, desanimado, abatido, um tanto calejado pelos solavancos da vida, desconfiado e com medo de amar, encontrei alguém que reavivou em mim a necessidade de compartilhar algo mais do que sexo por sexo. Mas, mais uma vez, enganei-me. O amor tornou-se impossível.

Tantas vezes reconfortei-me, provisoriamente, no contato quente do meu corpo em um outro corpo e, após ter o corpo aliviado pela descarga de algo preso a ele, como se estivesse sendo absolvido de todos os meus pecados, olhava para o lado e sentia uma imensa solidão. Estava apenas injetando uma droga qualquer em meu organismo e durante o seu efeito achava que viver era o máximo, quando, porém, ele acabava, não suportava o vazio da alma e embarcava numa nova onda de emoções, descargas e alívio, tudo sem nenhum sentido.

Entretanto, no meio do sem sentido da minha caminhada, encontrei um olhar sapeca e curioso, uma boca convidativa. Confesso que usei e abusei do banquete carnal a mim oferecido. Afinal, seria apenas mais um. A relação tornou-se repetitiva, a jovem dizia amar-me, procurava desvendar-me, saber das minhas estratégias, parecia ser uma excelente jogadora de xadrez.

Conhecedor, porém, deste jogo, e com medo de cair em suas garras, não disse nada. Mantive-me no decorrer de tantos encontros um estranho, como ela era para mim. Não sabia seu nome, origem, endereço, nada! Era alguma coisa que eu encontrei na rua. Uma vadia.

Mas o amor pegou-me, saí atrás daquela menina disposto a deixá-la quebrar-me, para conhecer o que de insignificante, cruel e nobre trazia meu ser. Disse-lhe o meu nome, o que fazia e que gostaria de viver ao seu lado, mas ela disse não.

Antes que eu pudesse pensar sobre a sua resposta, ela saiu correndo pelas ruas de Paris. Acreditando que eu a havia assustado, corri atrás dela, nem mesmo sabia o seu nome, mas a amava. Alcancei-a, beijei-a e começamos a dançar um tango. Pegando em seus cabelos perguntava o seu nome, enquanto começava a descer de meu pescoço um líquido viscoso, quente e vermelho. Estava perdendo os controle dos meus movimentos, ela com um olhar estranho e com um metal pontiagudo ensangüentado nas mãos me deixava cair no meio do salão. A melodia do tango ficava mais distante e finalmente encontrava o chão, sem vida, numa posição fetal.

Um comentário:

Anônimo disse...

Eu gostei. Muito bom mesmo!!! Tenho o hábito, o vício de ouvir música enquanto estou no computador... Não resisti, coloquei Astor Piazzolla para tocar. ADOREI!! beijo. Maria Cláudia